sábado, 25 de dezembro de 2010

A síndrome da dispersividade

 Esse tema tão pouco discutido é, no entanto, de importância singular para aqueles que desejam ter mais produtividade, criatividade e um melhor desempenho, além de menos ansiedade e stress.
A dispersividade é a tendência da pessoa desorganizada, sem foco e sem senso de priorização de fazer de tudo um pouco e, no final das contas, não conseguir terminar nada ou deixar a desejar na qualidade inicialmente esperada em seus projetos. Dispersividade é, numa definição simples, “espalhar os esforços”, ou seja, dispersar o foco em muitas coisas desconectadas entre si.
A maioria das pessoas sofre dessa síndrome por simples falta de educação sobre como priorizar corretamente e como manter o foco concentrado nas atividades que levam à concretização de planos definidos. Infelizmente, não aprendemos na escola como administrar eficazmente nossa futura vida adulta e quando chegamos lá nos deparamos com um emaranhado de responsabilidades e tarefas as quais não fomos preparados para realizar. Nossos educadores estavam ocupados demais testando nossa capacidade de decorar dados inúteis e procedimentos que jamais usaremos em nossa vida atual. Mas críticas ao sistema educacional à parte, o fato é que a maioria das pessoas tem problemas para priorizar e manter o foco não por incompetência própria, mas por simples desconhecimento mesmo.
Esses dias, no aeroporto, eu estava jogando um joguinho de celular chamado Bejeweled. À primeira vista, o jogo pode parecer um mero passatempo sem muita lógica. Um garoto de uns nove anos sentado ao meu lado puxou conversa me dizendo que sempre perdia o jogo dentro de alguns minutos fazendo alguns milhares de pontos e não podia acreditar que minha pontuação já passava de 1 milhão.
Vendo-me jogar, ele começou a me dar dicas, vendo todas as possibilidades de movimentos disponíveis. Nesse jogo, o objetivo é encontrar grupos de três, quatro ou cinco “jóias” iguais e alinhá-las horizontal ou verticalmente. Expliquei para o menino que o segredo do jogo não era alinhar todo e qualquer grupo de jóias só porque eles estavam disponíveis – aliás, esse era justamente o motivo pelo qual ele sempre perdia o jogo cedo demais. Em cada jogada, há apenas alguns movimentos prioritários que puxam o jogo adiante, sendo que a maioria dos movimentos possíveis é desnecessária e termina por trancar o jogo. Esse raciocínio também é aplicável a jogos como xadrez. Qualquer jogador de xadrez sabe que em cada jogada há apenas um grupo de movimentos (às vezes apenas um movimento) corretos, estratégicos. Os demais movimentos possíveis levam o adversário a obter vantagens ou são simplesmente movimentos desnecessários.
Mas de onde vem essa comparação com jogos? Qual a relação com prioridades e dispersividade? O segredo está na postura mental! A pessoa que tem o hábito de priorizar e tem um senso refinado para evitar a dispersão acaba aprendendo a jogar esse tipo de jogo da forma correta mais rapidamente. Isso porque a percepção de que não se deve fazer tudo que está disponível só porque você pode já está bem desenvolvida e compreendida na cabeça da pessoa e acaba refletindo até em coisas aparentemente bobas como joguinhos.
O segredo da priorização eficaz é ter uma consciência muito clara do que é importante em sua vida (para os seus objetivos e responsabilidades) e o que não é. A dificuldade desse processo é que essa é uma habilidade que precisa ser internalizada e precisa se manifestar através da postura mental, o que acaba por influenciar absolutamente tudo o que a pessoa faz.
A raiz da dispersividade é justamente a falta dessa noção internalizada de prioridade. A pessoa vai fazendo um monte de coisas na vida só porque pode, só porque as opções estão disponíveis, como o jogador de xadrez que vai mexendo as peças aleatoriamente só porque os movimentos estão disponíveis sem manter uma estratégia definida.
Dentro do conceito que desenvolvemos neste site, a compreensão de que o tempo é o recurso mais importante e também o mais limitado que temos é o ponto central para a construção de uma vida mais intensa e mais significativa. A pessoa que não compreendeu ainda que o que ela faz com seu tempo é, no final das contas, o que ela faz com a própria vida age de forma aleatória, fazendo movimentos e escolhas só porque elas estão disponíveis, sem critério, sem estratégia, sem direcionamento. No final das contas, os resultados obtidos na vida são medíocres, insignificantes. A maioria das pessoas mal consegue terminar a vida economicamente útil com dinheiro suficiente para evitar viver de aposentadoria e a parte financeira é apenas a ponta do iceberg. Quando entramos na questão da satisfação íntima para com os resultados obtidos na vida, a porcentagem que chega ao final da vida com um senso de realização é ínfima.
O segredo para evitar a dispersividade é, em primeiro lugar, definir claramente objetivos e prioridades. Em segundo lugar, aprender a dizer “não” para qualquer oportunidade ou atividade fora desse caminho já traçado. Não fazer as coisas só porque você pode, só porque a oportunidade apareceu, porque a escolha está disponível. Por último, internalizar esse senso de priorização e começar a utilizá-lo nas coisas mais insignificantes – como, por exemplo, um mero joguinho de celular. Mantenha em mente que seu tempo em vida é extremamente escasso e que para fazê-la valer a pena você tem que correr contra o relógio, fazendo só os movimentos “certos” e evitando os movimentos “errados” ou desnecessários.
No próximo artigo, vamos estender um pouco mais esse assunto abordando a questão da dispersão de possibilidades, a dificuldade em fazer escolhas quando há muitas opções disponíveis.

Fran Christy é formada em administração de empresas com especialização em planejamento estratégico. Fran vive em Seattle, EUA e escreve sobre desenvolvimento pessoal, produtividade e estratégias de vida.

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